“Hoje em dia convidem-me que eu vou! Perdi o medo de dar aulas em inglês”
Foi aos 17 anos que teve a sua primeira experiência de mobilidade – fez InterRail pela Europa. Já na universidade, quando o programa Erasmus ainda era recente, esteve três meses em Itália. Se a carteira lhe permitisse, participava em mais programas de mobilidade. Deu aulas ao abrigo do Erasmus na Universidade Autónoma de Barcelona, em 2011, e na Universidade Yeditepe na Turquia, em 2013. Apesar de ter recebido convites para fazer Erasmus na Polónia e Itália, o próximo destino já está escolhido – Atenas, na Grécia.
AULP – Quais as vantagens em fazer Erasmus?
FS – São todas (risos). Fazer Erasmus é fundamental do ponto de vista académico: conhecer outro ambiente, outros colegas, outro plano de estudos, lecionar a estudantes que têm um background e uma cultura diferente da nossa, dar a conhecer o nosso país e a nossa realidade… Sim, porque ninguém nos conhece. Nós só somos notícia quando há uma grande catástrofe ou quando morre alguém conhecido internacionalmente como a Amália ou o Eusébio. Estes programas são importantes para dar a conhecer o nosso país.
AULP – Porquê Istambul e Espanha?
FS – Foram duas situações diferentes. No caso da Universidade Autónoma de Barcelona eu já tinha recebido na ESCS vários colegas ao abrigo do programa Erasmus. Um deles sugeriu-me que eu me candidatasse e foi assim que fui a 1ª vez. No caso de Istambul foi porque eu nunca tinha ido à Turquia e tinha uma grande curiosidade.
AULP – Quanto tempo foi para a Turquia e para a Espanha?
FS – As estadias podem ser mais ou menos prolongadas, mas eu fui sempre em estadias curtas. Para Barcelona fui à 4ª e vim ao domingo. Dei intensivamente um dia de aulas (7 ou 8 horas) e depois fiquei para o fim-de-semana. Na Turquia dei dois dias de aulas.
AULP – Porquê tão pouco tempo?
FS – Por duas razões. Primeiro, porque se estes intercâmbios fossem mais prolongados trariam problemas do ponto de vista da gestão das minhas aulas em Portugal. Para além disso, este intercâmbio tem custos para os docentes.
AULP – Os docentes têm direito a bolsa quando fazem Erasmus?
FS – Sim. Existe uma bolsa, mas esta não cobre os gastos todos. A viagem é paga pelo programa e depois só podemos ter ajudas de custo durante três dias, sendo os outros dias à nossa responsabilidade. Ou vamos só mesmo os três dias, mas mesmo assim esse fundo de maneio não cobre todos os gastos, ou temos de investir dinheiro nosso. Por exemplo, na Turquia os hotéis são caríssimos. Um hotel de três estrelas em Istambul são 150 euros e o meu fundo de maneio diário eram 90. Ou seja, tem de haver um investimento pessoal por parte dos docentes, o que hoje em dia é complicado. Estamos com cortes salariais de ano para ano. Em 2014 era para fazer outra vez, mas estive a fazer contas e percebi que não podia.
AULP – Mudava algo no programa?
FS – Seria positivo que fosse mais tempo, pois isso facilitaria criar redes mais sólidas com as respetivas universidades e com os respetivos docentes. Para se formarem redes de possível investigação ou colaboração futura, estes timings são muito diminutos. Para além disso, é um investimento pessoal muito grande para se ir trabalhar. Eu já pensei várias vezes em ir para Estocolmo, mas tem um custo de vida muito elevado e por isso não posso ir. Aqui na ESCS há muitos docentes que não estão a ir por essa razão, por motivos económicos. Muitos não vão também porque não dominam suficientemente o inglês. Eu, por exemplo, não tenho filhos. No entanto, tenho colegas que tem dois e três filhos que não conseguem fazer Erasmus porque têm outras despesas, acabando por não ir.
AULP – A candidatura ao programa é um processo simples ou moroso?
FS – É um processo bastante simples. Há um período de inscrição em que a pessoa se propõe e depois preenche um pequeno formulário. Depois, ou é o gabinete de relações internacionais que inicia a relação com o gabinete da universidade para a qual vamos, ou, como foi o meu caso, já trazemos um contacto obtido por nós. Não é complicado nem moroso.
AULP – Como é que é dar aulas num país culturalmente tão diferente do nosso?
FS – Em Espanha foi relativamente fácil, pois a língua é semelhante. No caso de Istambul há diferenças significativas e ia mais receosa porque nunca tinha dado aulas em inglês. A maior parte dos estudantes falavam esta língua, mas eu pensava que falavam melhor. Depois percebi que o meu nível de inglês não era inferior ao deles. Hoje em dia convidem- me que eu vou! Perdi o medo de dar aulas em inglês. Uma coisa é dar aulas em inglês em países em que essa é a língua nativa, como na Inglaterra ou nos EUA. Quando estamos em espaços culturais em que a língua mãe não é o inglês, nós acabamos por estar todos mais ou menos ao mesmo nível. Eu não fui para a universidade pública, onde provavelmente a minha experiência seria completamente diferente. É uma universidade com conexões e financiamento dos EUA, ou seja, muito anglo-saxónica. O próprio campus universitário. Quando cheguei parecia que estava na América. Todo murado, com uns edifícios lindíssimos, com uns jardins fabulosos… Aquilo no meio do caos urbanístico. Parecia uma coisa saída de outro filme.
AULP – Mas os alunos eram turcos?
FS – Sim. Foram pessoas muito recetivas e curiosas, principalmente na segunda sessão em que falei no sistema mediático português. Nós vivemos num país pequeno que é muito desconhecido fora. Então se formos para a Turquia, a maior parte das pessoas não sabe onde fica este cantinho e desconhecem a nossa história. Conhecem o Cristiano Ronaldo, mas não conhecem mais nada. Senti-me na obrigação de começar a minha apresentação com uma caracterização da sociedade portuguesa.
AULP – Quem sugere os temas a lecionar?
FS – Somos nós que propomos, mas a universidade que nos recebe pode propor alguma coisa em particular. Normalmente o tema é escolhido de acordo com os interesses do docente.
AULP – Aconselhava outros colegas a fazer Erasmus?
FS – Aconselho todas as pessoas a passar por esta experiência. Não só os professores, mas também os alunos. No caso dos estudantes acho fundamental esta mobilidade porque no sul da Europa sai-se muito tarde de casa dos pais, temos mães muito “galinhas”, e há muita liberdade, mas pouca autonomia. Por isso, acho fundamentais os estudantes saírem, conhecerem outras realidades, terem de gerir o seu dinheiro, resolver os seus problemas, estar longe de casa, conhecer outras pessoas, outras línguas.
AULP – Acha que a mobilidade de estudantes é mais divulgada do que a de professores?
FS – É muito mais. Acho que o apoio financeiro concedido aos estudantes é superior ao concedido aos docentes. Contudo, no caso dos professores existem outras possibilidades de mobilidade, há outros programas, como ao nível da investigação. O docente pode fazer mobilidade por outras vias que não esta. No caso dos estudantes penso que o programa Erasmus é a via mais conhecida e utilizada.
AULP – Acha que o programa funciona?
FS – Eu sou absolutamente favorável a este tipo de programas e acho fundamental para a Europa porque se no caso dos EUA existe uma língua que unifica todo aquele continente, na Europa nem todos os países têm a mesma língua. Desconhecemo-nos profundamente uns aos outros, há diferenças históricas e o programa Erasmus é fundamental para que os povos da Europa se conheçam melhor.
Percurso Académico: Filipa Subtil é doutorada em Ciências Sociais pela Universidade de Lisboa. É professora na Escola Superior de Comunicação Social desde 1998, onde leciona na licenciatura e no mestrado. Foi visiting scholar no Departamento de Communication Studies da Universidade do Iowa, Iowa City (2010), e no Mulhenberg Collegue, nos EUA (2008). Os seus interesses de investigação têm-se centrado na sociologia da comunicação e na teoria social da comunicação e dos media nos EUA e Canadá, áreas onde tem publicado artigos e capítulos de livros. Publicou, em 2006, o livro Compreender os Media. As Extensões de McLuhan (MinervaCoimbra).