“Os pais podem ser a maior barreira para o Ensino em África”

Fonte:
Gabinete de Comunicação, 2014-04-07
São palavras da embaixadora da África do Sul, Keitumetse Matthews, que durante o 8º Seminário RDP África, que decorreu na Universidade Lusófona no passado 1 de abril, alertou para a existência de uma “cultura dos senhores doutores”, em que os pais menosprezam os cursos técnico-profissionais que conferem aos jovens africanos as “skills” necessárias para o desenvolvimento do país. É difícil explicar aos pais que o país precisa de canalizadores, carpinteiros, eletricistas, mecânicos, agricultores.O Professor Joaquim Azevedo, especialista em Ensino Técnico-Profissional, chamou a atenção para o facto de o Ensino Secundário não ter um objetivo por si só, a não ser a entrada no Ensino Superior. A crítica é feita aos governos que fazem com que haja um certo desprezo pelo Ensino Técnico-Profissional, apesar de atualmente 43% dos estudantes portugueses estarem em CET’s.

O presidente da RTP, Alberto da Ponte, e o secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros e Cooperação, Luís Campos Ferreira, estiveram igualmente presentes neste Seminário que marcou os 18 anos da RDP África.

“África tem um futuro brilhante em investigação”

O ministro do Ensino Superior, Ciência e Inovação de Cabo Verde, António Correia e Silva, reforçou o forte investimento de Cabo Verde numa economia competitiva e numa agenda visionária que tem como destaque o forte investimento na Educação.

O ministro disse que Cabo Verde começou por apostar nos seus alicerces: o Ensino Básico e Secundário foi melhorado. Exemplo disso é a existência de 50 liceus no país, tendo em conta que só existia 2 antes na entrada do novo milénio. António Correia e Silva deixou claro que o próximo passo é investir na qualidade do Ensino Superior e ter ambição na Ciência. “É necessário investir nos laboratórios e em programas de doutoramento nas áreas estratégicas, como o turismo e a agricultura.”

Independentemente das dificuldades atuais, o ministro acredita no futuro da investigação em África. “Os jovens estão a descobrir a Ciência; a população e a classe política estão, neste momento, a reconhecer o seu valor.”

“A Educação não é o motor do desenvolvimento, mas sim as pessoas”

Na sua intervenção, Joaquim Azevedo fez uma crítica às pessoas que chegam a África e trazem a “cabeça cheia de soluções”, apesar de não saberem qual é o problema. Acredita ainda que solucionar os problemas passa pela integração das pessoas na comunidade.

O especialista em Ensino Técnico-Profissional chamou ainda a atenção para a tendência existente em importar modelos dos países desenvolvidos para aplicar em África, o que costuma trazer constrangimentos quando esses modelos não são adequados à realidade do país e às características do local.

Joaquim Azevedo faz ainda um apelo às empresas portuguesas: que estas se envolvam mais nos projetos que visam solucionar os problemas locais. No seu ver, muitas empresas usam África como pano de fundo das suas “selfies”, usando o país para ficarem bem na fotografia.

“As empresas petrolíferas em África gastam mais de 1 milhão de euros por dia e empregam um moçambicano”

Esta é uma questão que preocupa o Professor Tito Fernandes. Um dos problemas da Educação em Moçambique é a falta de empresas no país para os estudantes africanos poderem aprender no terreno. “Falta uma relação entre as empresas e as universidades”, aponta. O Professor disse ainda que os financiamentos de cooperações internacionais não funcionam em Moçambique devido a problemas de governação.

O Professor Tito Fernandes considera que os países africanos deviam apostar no envio de alunos para fora, na esperança de que estes “cérebros” voltem para desenvolver os seus países. Alerta, no entanto, para os perigos do “copy-paste” dos modelos de educação de outros países, sendo necessário desenvolver “um saber nacional, adaptado às realidades locais”.

O Professor Tito Fernandes salientou que a Universidade Lúrio tem como objetivo principal formar cidadãos. Uma das disciplinas que integra todos os cursos da Universidade permite ao aluno estabelecer uma relação direta com a comunidade africana ao acompanhar uma família. “Os biólogos, têm uma lição com os pescadores. O aluno vai buscar os problemas deles e aprender com eles para mais tarde poder ajudá-los. É um fluxo de informação. Comunidade – Estudantes; Estudantes – Comunidade”, explica Tito Fernandes. Este programa existe desde o início da Universidade, em 2007.

O Professor é da opinião que não se faz investigação em Moçambique, pois não existe no país laboratórios e doutores para tal. Para o professor, investigação é trabalhos originais publicados. O que se faz em Moçambique é pesquisa (replicar trabalhos feitos com sucesso noutros países). Na sua opinião, não cabe às instituições de Ensino Superior inovar, mas sim as empresas que têm esse interesse, sendo o papel das universidades é acompanhar as empresas.

“É melhor ser imaginativo do que culto”, disse Tito Fernandes, citando Einstein. O professor acredita que “daqui a 30 anos, Moçambique terá mestres, doutorados e um ensino superior de qualidade”.

O professor quis deixar ainda a mensagem: “nós não formamos investigadores, mas sim pensadores ou pessoas que sabem investigar.”

O Ensino Superior e a Formação Profissional em África

A mesa contou com o atual ministro cabo-verdiano do Ensino Superior, Ciência e Inovação: António Correia e Silva, o catedrático e diretor científico da Universidade Lúrio, de Nampula (Moçambique), Tito Fernandes e com o diretor do Centro de Estudos em Desenvolvimento Humano da Faculdade de Educação e Psicologia (UCP – Porto) e especialista em Ensino Técnico-Profissional, Joaquim Azevedo.

Este seminário teve os seguintes temas em debate:

– Políticas Públicas e os Recursos para a Qualificação dos Cidadãos nos países africanos e, particularmente, em Cabo Verde.

– Globalização do Conhecimento e a Comparticipação Africana na Investigação e Inovação.

– Formação Técnico-Profissional como Opção Estratégica de Desenvolvimento.

Artigo de Pandora Guimarães

Gabinete de Comunicação da AULP